Euforia, apogeu, modificação, retracção e declínio em 15 minutos – a crítica travessa a uma espinha entalada na garganta


bas dost 6

No capítulo da gestão de uma vantagem magra (de um golo, suponhamos), um treinador pode optar (e trabalhar; porque efectivamente estas situações tem forçosamente que ser bem trabalhadas, bem operacionalizadas) por 3 caminhos estratégicos:

  • A manutenção da estrutura táctica e da “exibição ofensiva” exibida até aquele momento pela equipa, pedindo portanto aos jogadores para não travar o ímpeto ofensivo e defensivo verificado até ao momento para poderem ampliar rapidamente a vantagem. Esta opção deve ser tomada quando as pernas dos jogadores ainda se encontram frescas. É portanto uma opção suicída para os minutos finais de uma partida.
  • A manutenção ou alteração da estrutura da equipa através da realização de uma ou mais substituições que possam conferir pernas frescas ao jogo que não contenha qualquer mudança de índole estrutural de ordem táctic (posicionamento das linhas de pressão, intensidade na reacção à perda) desde que a equipa seja capaz de efectuar correctamente a gestão do ritmo de jogo, baixando-o, enquanto executa em simultâneo uma rigorosa e segura gestão de posse de bola, preferencialmente no meio-campo adversário, de maneira a, inteligentemente, retirar essa mesma posse ao adversário nos minutos seguintes à obtenção da vantagem (reduzindo portanto o grau de exposição à mais que previsível reacção adversária), factor que obviamente o impedirá de ter posse e aproximar-se da sua baliza.
  • A alteração drástica da estrutura táctica da equipa, modificando a atitude até aí exibida pelos jogadores, os posicionamentos, as funções, a organização defensiva e por aí adiante.

A segunda opção é na minha opinião a opção mais efectiva (se os jogadores tiverem a noção perfeita de como baixar o ritmo de jogo e controlar a posse; evitando ter que se submeter ao tempo e à pressão da iniciativa adversária, pressão que naturalmente tenderá a ser maior após a concessão de um golo), a opção que comporta menos riscos (se os jogadores procurarem fazer circular a bola entre si com segurança, privilegiando em primeiro lugar opções seguras de passe que lhes são oferecidas pelos companheiros em detrimento de opções de passe mais tentadoras ao nível de progressão e ataque ao espaço\baliza adversária, mas ao mesmo tempo, de maior susceptibilidade de vir a provocar risco defensivo em caso de perda do esférico) e a mais correcta para gerir vantagens porque cria na psíque do adversário um conjunto de efeitos perversos que são benéficos para a equipa que está a gerir a vantagem. Entre alguns desses efeitos perversos criados pela gestão do jogo através de controlo do ritmo de jogo e da posse de bola está por exemplo o aumento dos índices de nervosismo nos jogadores adversários, aumento que se reflecte obviamente no nível da impetuosidade com que procuram recuperar a bola (cometendo mais faltas, faltas essas que consequentemente quebram o ritmo de jogo, fazendo, como se diz na gíria futebolística “fazendo correr o marfim” para a equipa que está em vantagem) e na diminuição do discernimento com que os seus jogadores constroem jogo, subfactor que advém obviamente da maior limitação íntrinseca ao próprio jogo: o factor tempo. Quando uma equipa cheira a bola, enerva-se. Quando uma equipa passa minutos a cheirar a bola, a reacção mais natural que se dá ao nível da psique dos jogadores é o que eu chamo de fenómeno de 1 contra todos – ou seja, acções nas quais, o jogador, limitado pelo tempo e pela pressão, tenta resolver individualmente acabando por perder a bola.

Jorge Jesus não partilha da mesma opinião. Para Jorge Jesus, a gestão de uma vantagem magra realiza-se, através de uma alteração drástica da estrutura táctica da equipa e da sua atitude, oferecendo a posse ao adversário ao mesmo tempo em que o bloco defensivo recua drasticamente até às imediações da área (deixando portanto de pressionar em terrenos adiantados; a verdade é que um dos méritos alcançados pela formação leonina residiu na voracidade com que esta pressionou o Braga em terrenos adiantados nos momentos de saída ou recuperação do esférico) e os jogadores revelam comportamentos estranhíssimos (quase que como se desligando do jogo) estratégia que só não resultou numa sequência de dissabores nos minutos finais das partidas contra o Feirense e Estoril porque a formação leonina foi literalmente salva pelo gongo (pelo videoárbitro, no caso do jogo contra o Estoril) mas, que por outro lado, foi efectivamente uma das razões que ajudou a explicar os “desaires” sofridos nos minutos finais frente à Juventus.

Não me venham justificar este autêntico “nervous breakdown” verificado nos últimos 15 minutos da partida com o factor cansaço. Não me venham, muito sinceramente, com essa justificação porque, a meu ver, esse argumento é por várias razões, falacioso: para uma equipa “globalmente” cansada, é preferível acometer esforços na salvaguarda da posse e na colocação de um ritmo de jogo baixo, ou seja, adequado ao estado físico sentido pelos jogadores, do que recuar (no fundo, demonstrar aquele comportamento de pânico que galvaniza o adversário, que o incentiva a subir, a arriscar, no fundo a entregar-se ao jogo; adversário que até então não teve “abundância de bola” nos pés no meio-campo adversário) drasticamente o bloco e as linhas de pressão e entregar a posse adversário. Claro está que Abel arriscou tudo o que tinha para arriscar e os jogadores bracarenses sentiram que, estando o adversário a iniciar uma marcha à ré e estando o jogo “perdido por cem, perdido por mil”, tinham que dar tudo nos minutos finais para transformar uma exibição mediana num bom resultado, estando esse bom resultado ao alcance de uma “inenarrável falha” de um jogador leonino. Por outro lado, o cansaço verificado nesta altura da época (visível a olho nu; nos próximos 15 dias a enfermaria de Alcochete não terá mãos a medir) não é mais nem menos do que fruto que Jesus colheu da árvore da sua teimosia e da sua casmurrice. O fruto de um treiandor que não sabe gerir o tempo de jogo de vários discipulos, rebentando-os até à exaustão, o mestre cuja preferência “Judas sobre Tiago” (ou como quem diz a Alan Ruiz sobre Francisco Geraldes), o fruto de um treinador que não consegue ler “momentos de extremo cansaço” nas viseiras dos seus jogadores, e o fruto de um treinador que, contra o Chaves, a ganhar por 4-0 aos 55″ decidiu prolongar a estadia de alguns jogadores cansados por mais alguns minutos.

As fases de declínio de qualquer empreitada, obra, império, nação, usos, costumes, tradições começam a suceder-se a partir do momento em que são feitas alterações substanciais à sua forma e ao seu conteúdo. Ponto. Quando uma tradição é alterada, deixa de ser tradição. Quando um imperador perdeu o tacto ao seu povo, legislando sempre em seu benefício, o povo acaba por revoltar-se. Ao longo dos últimos anos, Jorge Jesus tem-se tornado mestre no envio de sinais através de código morse para o treinador adversário. Com a entrada de Palhinha em Turim, Jesus disse a Allegri: “vou recuar. tété. vou recuar. Anda. Ataca-me pelas faixas. Vou lá colocar o nosso jogador menos intenso e menos agressivo, o Bruno Fernandes. Anda. Ataca-me pelas faixas. Teté”. Allegri atacou, e ganhou o jogo. O mesmo voltou a repetir-se de certa forma no jogo de quarta-feira. Quando Jesus faz recuar aquele bloco defensivo, desnorteando por completo a equipa, Abel altera tudo, tira um lateral para colocar um extremo e passa a atacar com 8 jogadores envolvidos no processo ofensivo.

E Coátes, bem, Coátes foi um verdadeiro anjinho no lance da grande penalidade. Convenhamos: Coátes fez uma exibição horrível em todos os aspectos. Na primeira parte, num momento de pura desconcentração (convenhamos: nos primeiros 45 as duas linhas de pressão mais avançadas do Braga não foram excessivamente pressionantes e até permitiram aos leões penetrar em diversas situações no interior do seu bloco; permitindo aos centrais ou a Battaglia fazer entrar a bola na meia lua nos apoios frontais oferecidos por Dost; permitindo a Ristovski procurar Bruno ou Bruno César à entrada da área) o uruguaio já tinha oferecido aquele generoso brinde que Paulinho, ingenuamente, não aproveitou quando tentou fazer um chapéu sobre Patrício. Nos minutos que antecederam ao golo, existem três falhas dos centrais no controlo à profundidade, capítulo em que os ditos, nos primeiros 45 minutos, até estiveram bem face à quantidade de bolas longas lançadas pelos médios bracarenses à procura das desmarcações verticais e circulares de Paulinho sobre os centrais, pendendo regularmente para a ala esquerda: primeiro, logo a abrir a segunda parte naquele golo incorrectamente invalidado a Fransérgio (no momento do passe, o jogador não está em fora-de-jogo e Paulinho, apesar de estar em situação irregular no momento do passe não se faz ao lance), o segundo aos 76″ num lance onde Gelson, na área, evita males maiores e o segundo um minuto antes do fatídico lance que arrumou com uma boa exibição ofensiva, num lance em que

No lance da grande penalidade cometida sobre Danilo…

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Eu compreendo que no momento em que saem para a abordagem ao adversário no interior da área, todos os centrais partilhem do mesmo sentimento: a vontade de jogar a bola, a vontade de fazer a contenção limpinha, a vontade de proteger a saída da bola sem fazer falta. Todos os centrais acreditam convictamente que indiferentemente do tempo de entrada ao lance, não vão cometer falta sobre o adversário e vão anular a situação com eficácia. Todos no fundo, confiam na sua percepção e nas suas capacidades atléticas.

O lance nasce de um passe para uma desmarcação habilmente engendrada por Danilo, colocado estrategicamente entre a linha defensiva e a linha média, numa zona onde existe um enorme buraco…

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  1. Enorme distanciamento existente entre Coátes e André Pinto.
  2. A vermelho: o que é que estava ali a fazer Bruno? Estava a fazer contenção ao quê? O médio estava a preencher uma zona morta, onde não existia qualquer adversário, ou seja, de onde não saíria qualquer perigo. Porque é que não ajustou a Danilo, ajustamento que lhe permitiria acompanhá-lo, limitar a sua recepção, impedi-lo de virar? Porque é não tentou preencher atempadamente aquele espaço livre?

Ao jogador que passou foi fácil perceber como e para onde é que deveria fazer o passe.

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Obrigado a receber de peito a bola foge ligeiramente a Danilo. Perante a saída de Coátes, o brasileiro tem duas opções: ou tenta chutar de primeira ou tenta adiantar a bola de forma a dispô-la em condições de ainda visar a baliza ou… provocar um erro a Coátes! Na minha opinião, o central uruguaio caiu que nem um patinho na esparrela montada pelo astuto médio brasileiro, visto que, como podemos ver na primeira imagem, no momento em que Danilo volta a adocicar o esférico para tentar adiantar a bola sobre o uruguaio, está de perna esticada, em esforço para chegar aquela bola. Estando em esforço no momento da segunda recepção, anula-se a possibilidade de vir a chutar de primeira e, creio (pelo menos tenho essa percepção) que jamais conseguiria chegar aquela bola.

A equipa desnorteou-se por completo. Prova disso mesmo é o lance que vai dar origem ao 2º golo dos baracarenses. Outra obra magnífica de Coates, a meias com Bruno Fernandes.

O extraordinário esforço defensivo de Ristovski (o macedónio fez mais uma agradável exibição, na qual a sua maior projecção no terreno permitiu-lhe uma maior ofensividade aos processos ofensivos da equipa no primeiro tempo, apesar de Jorge Jesus ter abdicado de maior amplitude e largura quando pediu aos extremos que caíssem com maior regularidade no corredor central para auxiliar os esforços de construção) foi completamente anulado pela perfeita estupidez partilhada a meias por Coátes e Bruno Fernandes no lançamento do ataque

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Quando o uruguaio faz o passe, Bruno está efectivamente solto, tendo espaço para acelerar a transição para o contra-ataque.

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Bruno apercebe-se que Esgaio sai na pressão para interceptar a bola. Porque é que, estando minimamente equilibrado e consciente do movimento adversário, o médio não tenta antecipar-se para evitar que o adversário ganhe o esférico ao mesmo tempo em que o contorna para poder assim criar uma situação ainda mais favorável ao lançamento daquela acção de contragolpe?

P.S: O penalty conquistado por Alan Ruiz deverá ter sido certamente a melhor acção de sempre ao serviço do Sporting. Não deixa de ser, no mínimo, irónico! Já pensaram na probabilidade de poderem vir a conquistar o campeonato com 1 ponto de diferença para Benfica e Porto? Já perspectivaram que o título poderá ter sido conquistado à conta do penalty conquistado pelo argentino?

4 opiniões sobre “Euforia, apogeu, modificação, retracção e declínio em 15 minutos – a crítica travessa a uma espinha entalada na garganta”

  1. João, desculpa o vernáculo, mas o JJ devia ir levar nos entrefolhos da arrogância dele e ir para o real caralhinho.!!
    Era um desastre anunciado!!!!
    JJ continua a ser completamente acéfalo a substituir. Tanto na forma como o faz, como no timing!!! Ele que olhe para a maneira como o S. Conceição mexeu no jogo com o Leipzig, após o 2-1!!!
    Ele ontem após o 1-0, tinha que ter metido o Doumbia (no lugar do Bas Dost) e tirar o Gelson para meter o Petrovic, avançando o Batagglia.
    Estou para ver que jogadores vamos ter para jogar com o Olimpiakos…
    Ora xxxx-se!!!

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  2. O parágrafo sobre o “pénalti” do Coates é uma redundância, porque as imagens não mentem: Coates joga, apenas e só, a bola. O resto é um jogador adversário Chico Esperto e um árbitro e VAR que já demonstraram, por A+B, que prejudicarão o Sporting em tudo o que puderem – vide Ricardo Esgaio sequer ter terminado a primeira parte, quanto mais jogar a segunda!

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  3. Meus caros, perdoem-me o facto de vos estar a responder tarde e a más horas. Infelizmente, na segunda-feira, fui atacado por uma virose gripal que me colocou num estado semi-desperto durante o dia de ontem.

    Miguel, acrescento: acéfalo a substituir e acéfalo a gerir vantagens (o recuo do bloco defensivo em vantagem só tem dado, desculpa-me a expressão em vernáculo, merda) e a gerir o físico dos planteis. Como é da tua concordancia, visto que já o mencionaste noutros posts, o Jorge Jesus esgota os jogadores até ao limiar do suportável. As consequÊncias são bem visíveis: neste momento tem meia equipa titular na enfermaria, e alguns dos casos são graves e podem obrigar os jogadores (Dost, Acuña e Mathieu) a ter que parar 2 ou 3 meses.

    Ricardo: não tenho a mesma percepção. O Coates caiu na esparrela montada pelo Danilo. Quando lá chegou já o Danilo tinha habilmente adiantado a bola com um toque para a frente. Quanto ao Ricardo Esgaio, tens toda a razão 🙂

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